No mês passado, recebi a inesperada notícia de uma morte precoce na família. A morte de uma prima que esteve muito presente na minha infância. Nossas famílias eram muito próximas e parecidas: pai, mãe e quatro filhos. No caso dela, quatro filhas; na minha família, três meninos e uma menina. Nos encontrávamos todo final de semana, brincávamos juntos.
Foi de repente, um câncer fulminante, que a levou em menos de dois meses depois de descoberto. Há décadas, desde que me mudei com a família de Cambará para Curitiba, não tínhamos contato constante. Mas as lembranças são marcantes.
Tudo que sei de seus últimos dias é edificante. Ao contrário da ideia talvez generalizada, sua morte parece-me – com exceção, obviamente, da precocidade – o tipo de morte ideal, a morte de antigamente: aquela na qual há tempo para pensar, refletir, preparar-se, despedir-se. Contaram-me que foi exatamente assim com ela, que pôde falar com cada uma das filhas, com o marido, com as irmãs, com aqueles que a assistiam nos últimos instantes. Não, nada da morte repentina e imediata, tão desejada por muitos hoje, mas a “morte bem morrida”…
Lívia, leve, nívea, neve… As palavras que me vinham quando pensava no seu nome não correspondem exatamente à imagem que sempre tive dela, muito mais cheia de cores: uma mulher sempre jovem, sempre muito bonita, animada, forte, corajosa, independente. Tão corajosa a ponto de criar três filhas no mundo de hoje!
Sua cerimônia fúnebre foi de forte emoção. Eu, que já fui muito religioso e hoje sou um tanto cético, admirei-me da força de sua família. Para mim, a morte é incompreensível – as explicações da religião parecem-me construções consoladoras diante do inexorável. Mas vi nas minhas primas uma força que certamente vem de suas convicções religiosas.
Na cerimônia fúnebre que poderia ser qualificada de “pós-moderna” – tão adequada aos tempos de hoje, sem perder nada da dignidade e da emoção próprias de um momento como esse – foi exibido um filme com uma mensagem muito bonita. Falava de um veleiro que se distanciava da costa: aqueles que o viam partir o perdiam de vista e poderiam acreditar que ele desaparecera na linha distante onde o céu toca as ondas. Entretanto, além-mar, os que esperavam do outro lado a chegada do veleiro viam-no crescer pouco a pouco até se aproximar. Apesar das diferentes visões, o barco que atravessou o oceano era sempre o mesmo, igual a si próprio, íntegro, em qualquer dos lados da passagem. Uma bela mensagem, talvez enfim um consolo para minha visão inconsolável da morte.
Ao final, as tocantes palavras de despedida dos familiares, para as quais não há comentário possível senão as lágrimas… Felizes dos que têm a certeza do reencontro!
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bem, também como primo, senti e sentirei mesmas emoções e saudades que você. A msg final (do veleiro), de fato, me parece a que mais se adapta ao momento em questão. Como disse a Noara, começam a se partir pedaços da nossa infância. Bom, como consolo, temos mais um anjo a velar por nós.
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Não tenho palavras para expressar minha tristeza sobre a partida de nossa querida, forte, alegre (chorava sempre de tanto rir), super bonita prima e com uma história de amor que sempre achei linda. A mensagem do veleiro nos dá a esperança de um reencontro com já tantos entes queridos que "sumiram no horizonte". A ceia de Natal de nossa infância era em uma mesa enorme, tábuas que eram colocadas sobre cavaletes para caber toda a grande família. Hoje, só precisa de umas poucas cadeiras. A dor e a saudade é sempre de quem fica.
Noara