“Éramos seis...”

Cemitério da Consolação, São Paulo. Uma tarde ensolarada em meados de maio de 1984. Minha alma, então no frescor da fé, vaga entre as tumbas, envolta na oração e na contemplação da arquitetura mortuária, por vezes tão complexa quanto o mistério que representam seus monumentos: beleza, horror, leveza, tormento, despojamento, luxo… díspares ideias concretizadas no tijolo e na pedra. Próximo ao corredor dos fundos, sombreado por comprida fileira de árvores,

Isso de ser pai...

Hoje, completei meu 19º ano de pai. Ou 20º, se se puder considerar o filho ainda no ventre, a promessa depois cumprida. E, entretanto, não houve ainda acúmulo de decênios que me trouxesse explicação para isso de ser pai. Essa improvável expansão de si mesmo a partir do outro, esse estender-se para fora de si, esse abrir-se em céus e abismos, glórias e tormentas antes sequer imagináveis. Que encanto é

Gênero biológico, identidade e sexualidade

É fato que, quando um ser humano nasce, porta um gênero biológico, definido primariamente como masculino ou feminino de acordo com a aparência de seus órgãos genitais. É certo, também, que seres humanos carregam diferentes cromossomos, e que, na genética humana, foram identificados os cromossomos sexuais, classificados como XX para os indivíduos do sexo feminino e XY para os do sexo masculino. Ou seja, há uma diferença biológica que determina

Língua Portuguesa e seu uso: quem define o que é “correto”?

O objetivo do uso da língua O objetivo da língua é a comunicação. Aprendemos desde cedo a nos comunicarmos utilizando determinada língua, que é também fundamental para a estruturação de nosso pensamento e a formação da nossa visão de mundo. A língua utilizada para comunicação entre os brasileiros é a Portuguesa, que se tornou língua oficial da colônia por ordem do Marquês de Pombal, então primeiro ministro de Portugal, em

Estarei no estádio no próximo jogo

Quando o homem de preto assoprar a latinha para o início da peleja, eu estarei lá. Estarei no meio da torcida, vibrando, gritando, aplaudindo, incentivando o meu time. Não importa qual será o jogo, que time estará do outro lado, qual o campeonato. Pode ser um time “sem série” na Copa Sul-Americana, na Copa do Brasil, na Sul-Minas ou Sul-Minas-Rio. Pode ser um Torneio da Morte ou um “ruralzão”. Não

"Afazeres"

Dia de folga durante a semana. Dou uma olhada na lista de afazeres. Fazer essas listas é hábito herdado de meu pai, que andava com cartões no bolso onde anotava tudo que precisava fazer, riscando as tarefas cumpridas. Diariamente, renovava a relação, incluindo coisas da véspera que não tinha conseguido deslindar. Minha lista para o dia de folga tem várias coisas que não consigo fazer nos “dias úteis” porque trabalho

Direita e esquerda – O que é isso?

Você é de direita ou de esquerda? Por quê? Tenho lido e ouvida tantas ideias confusas a respeito desses conceitos que me arrisco a escrever aqui sobre eles, esperando ser de alguma forma útil… O texto abaixo é aberto a contribuições – espero correções e observações pertinentes. 1) Esquerda e direita são sempre conceitos relativos, nunca absolutos. Evoluem e variam conforme o tempo e o espaço. Não são preto e

A tirania da publicidade

“Para reduzir a humanidade à escravidão, a publicidade escolheu a dissimulação, o jeitinho, a persuasão. Vivemos no primeiro sistema de dominação do homem pelo homem contra o qual até a liberdade é impotente. Ao contrário, ele aposta tudo na liberdade, é este seu maior achado. Toda crítica lhe dá o bom papel, todo panfleto reforça a ilusão de sua tolerância melosa. Ele submete a todos com elegância. O sistema atingiu

A importância da arte

Belíssimo texto publicado pelo Alessandro Wainer: Em 1993, Susan Sontag foi a Sarajevo. A cidade estava destruída por causa da guerra. Ninguém estava seguro na Bósnia. Ela pensou que iria ajudar a carregar sacos de cimento, cuidar de doentes, enfim, dar pão a quem não tinha. Mas não. Pediram que ela montasse uma peça de teatro. Ela escolheu Esperando Godot, de Becket. Por que pediram que ela montasse uma peça

O hábito não faz o monge, farda não impõe caráter

Atenção, Senhoras e Senhores: o hábito não faz o monge. FARDA NÃO IMPÕE CARÁTER. Militares não são seres impolutos apenas por usarem farda. Ao longo da história, em todas as épocas e lugares, militares foram responsáveis por perpetrar os maiores crimes da humanidade, em qualquer regime, em todos os continentes. Eles podem ser úteis (e são, efetivamente, muitas vezes), caladinhos no canto deles, cumprindo a função de garantir a segurança,